Cerca de 80 pessoas foram encontradas vivendo em condições análogas à escravidão em uma fazenda na cidade de Vila Valério, no Norte do Espírito Santo.
Os trabalhadores foram localizados nesta sexta-feira (7) por auditores fiscais do trabalho em uma operação com a Polícia Federal.
Os trabalhadores, entre eles três adolescentes, são todos da região do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, de onde saíram no dia 17 de abril com o objetivo de trabalhar na colheita do café na fazenda Vargem Alegre, em Vila Valério.
De acordo com informações da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE-ES), que está à frente das investigações do caso, os trabalhadores viviam em condições precárias e sem direito a salário.
Conforme explicou o auditor fiscal e superintende regional do trabalho Alcimar Candeias, toda a negociação e o transporte deles para o Espírito Santo foi feita com o auxílio de um homem que atua como um gerenciador para este tipo de atividade ilegal.
Ao chegarem a Vila Valério, no entanto, os trabalhadores foram divididos em dois alojamentos e tiveram os documentos retidos.
Segundo Alcimar, além de não receberem salários e de não terem a carteira assinada, eles eram ameaçados pelo proprietário, que dizia que eles teriam que trabalhar para pagar o dinheiro gasto com as passagens e comida. Caso não trabalhassem para pagar a dívida, eles eram impedidos de deixar a propriedade. “Eles tinham medo de que não sobrasse nada para eles”, pontuou o auditor fiscal.
A fazenda Vargem Alegre, na qual os trabalhadores foram encontrados, fica na localidade de Jurama. De acordo com o Candeias, a propriedade pertence a Raul Alves Roberti, marido da atual secretária de Saúde de Vila Valério, Cazuza Zorzanelli Rossini.
Casos de Covid-19
A SRTE-ES ainda informou que os trabalhadores já tinham sido testados para Covid-19 e uma grande parcela testou positivo para a doença. Mesmo assim, eles permaneciam no local sem nenhum tipo de tratamento ou isolamento social.
“Eles fizeram a testagem, mas não tomaram providência nenhuma relacionada aos protocolos contra a Covid-19. As pessoas, mesmo doentes, foram mantidas trabalhando e alojadas junto aos demais, sem que houvesse isolamento”, pontuou Alcimar Candeias. O auditor reiterou que a SRTE não questiona a realização das testagens, mas a falta de a falta de providências em relação aos doentes.
Ainda segundo o auditor, ao tomar conhecimento de que haveria uma fiscalização, o proprietário da fazenda tentou retirar os trabalhadores do local.
“Mas a fiscalização chegou a tempo. Quando chegamos lá, as pessoas estavam com as bolsas prontas”, detalhou Alcimar.
O dono da fazenda não foi encontrado até o momento. A advogada de Raul Alves, Tatiana Costa Jardim, disse que ele não recebeu nenhuma notificação formal sobre o caso e que ele estava fora da cidade nesta sexta-feira.
O que diz a prefeitura
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Prefeitura de Vila Valério confirmou que a fazenda na qual foram constatadas as irregularidades pertence a familiares da atual secretária de Saúde.
No entanto, o município afirmou que a testagem para a Covid-19 foi realizada em trabalhadores de diversas propriedades rurais de Vila Valério e pontuou que não houve nenhum tipo de privilégio em relação à fazenda dos parentes da secretária.
A Prefeitura disse, ainda, que Cazuza Zorzanelli Rossini não tinha como saber sobre as irregularidades que aconteciam na fazenda do marido por não ter conhecimento nessa área.
“A Secretaria Municipal de Saúde atendeu praticamente todas as fazendas e sítios do interior de Vila Valério na testagem do Covid-19, não privilegiando ninguém. No tocante à fazenda em questão, não cabe à Secretaria de Saúde autuar, multar ou fiscalizar as condições de trabalho aplicadas por cada proprietário de terra, ficando essa responsabilidade a cargo do Ministério Público do Trabalho, da Polícia Federal e de outros órgãos competentes”, disse a Prefeitura em nota.
Fonte – G1/ES – Foto: Gabriela Fardin/ TV Gazeta