Preso na Espanha há um ano e um mês e condenado por tráfico de 37 kg de cocaína, o segundo sargento da FAB (Força Aérea Brasileira) Manoel Silva Rodrigues segue na ativa da instituição recebendo salário em dia. No Brasil, ele é réu por tráfico de drogas com valor estimado em R$ 6,3 milhões segundo o Ministério Público Militar.
Segundo informações levantadas pelo UOL junto ao Portal da Transparência, apesar de estar detido e sem trabalhar desde junho de 2019, o militar recebe brutos R$ 8,1 mil mensais, incluindo verbas indenizatórias. Em novembro, o valor bruto chegou a R$ 14,5 mil, devido à gratificação natalina. Ao longo de todo esse período, seus salários somaram cerca de R$ 97,5 mil.
Segundo informações apuradas junto à Justiça Militar, no processo em que ele é réu, não houve pedido de bloqueio. Os pagamentos dizem respeito à questão administrativa da FAB.
Segundo a FAB, Rodrigues foi notificado da abertura do processo de exclusão. Mas para ser desligado administrativamente é necessário o trânsito em julgado (quando não cabe recurso) do processo judicial, que embasa o processo interno, segundo informou a FAB.
Além do processo que responde na Espanha, há uma acusação na Justiça Militar. O juiz da 2ª Auditoria da 11ª Circunscrição Judiciária Militar, Frederico Magno de Melo Veras, marcou para dia 20 de agosto uma audiência de instrução.
Nesta fase, o juiz vai ouvir testemunhas de acusação indicadas pelo Ministério Público. Ainda será necessário ouvir a defesa e testemunhas do sargento antes de o magistrado decidir sobre o caso. O juíz Veras solicitou à Justiça espanhola, via Ministério da Justiça, autorização para que Rodrigues participe da audiência por vídeo conferência.
A prisão de Rodrigues aconteceu em junho de 2019, durante viagem de Jair Bolsonaro (sem partido) à cúpula do G20. A cocaína estava na bagagem do sargento que voou em uma aeronave de apoio da comitiva presidencial. Ele não estava no mesmo voo do presidente.
O sargento integrava uma equipe de 21 militares que prestava apoio à comitiva que acompanhou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na reunião do G-20, no Japão. A droga foi encontrada pela Guarda Civil da Espanha ao vistoriar a bagagem dele no aeroporto de Sevilha (Espanha).
À ocasião, Bolsonaro disse que o sargento pagaria um preço alto pelo ocorrido e que “se fosse na Indonésia, pegaria pena de morte”. E o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) o classificou como “uma mula qualificada”, termo utilizado para designar quem faz transporte de droga.
Processos
Na ação espanhola, Rodrigues foi condenado a seis anos de prisão. O juiz do caso fixou multa em 2 milhões de euros (cerca de R$ 12 milhões). Durante o processo, o sargento disse que aquela foi a primeira vez que traficou drogas, porque seu salário “não é muito alto” e passava por dificuldades financeiras.
Segundo o jornal ABC de Sevilla, Rodrigues afirmou à Justiça que teria que entregar a droga para uma pessoa que lhe faria “um sinal” num centro comercial. O destino do entorpecente era a Suíça.
o Brasil, o promotor da Justiça Militar, Jorge Augusto Caetano de Farias, investigou a participação da então companheira de Rodrigues, um tenente-coronel (cargo de alta patente na FAB), dois sargentos e um soldado, mas pediu arquivamento da investigação. Com o pedido, o juiz do caso determinou o arquivamento e deu prosseguimento à denúncia contra Rodrigues.
Na acusação contra o sargento da FAB, o promotor pediu pena de prisão de até 15 anos por tráfico de drogas, podendo ser aumentada em até dois terços em razão do delito internacional e por considerar que ele utilizou-se da função.
Na denúncia, o promotor acionou a Lei de Drogas. É um mecanismo mais rígido. Pelo código penal militar, a penalidade máxima é de cinco anos para este tipo de crime.
A PF (Polícia Federal) também tem uma investigação sobre o caso, no Brasil. A suspeita é de que o sargento operava como “mula”.
Outro lado.
O advogado do sargento, Eric Furtado, do escritório Furtado e Jaime, não quis se manifestar. Ele disse ao UOL, por e-mail, que a pedido da família não dará entrevistas ou informações sobre o processo, que corre em segredo de Justiça.
A FAB e o Ministério da Defesa se pronunciaram utilizando o mesmo posicionamento.
Em nota, informaram que o “IPM (Inquérito Policial Militar) instaurado no âmbito do Comando da Aeronáutica para apurar o caso do sargento detido no aeroporto de Sevilha, Espanha, em 25 de junho de 2019, foi concluído dentro do prazo. Os autos foram encaminhados para a Auditoria Militar competente, que enviou para o Ministério Público Militar, a quem coube oferecer a denúncia, estando a ação penal em curso, conforme determina o Código Processo Penal Militar”.
Segundo a FAB, foi dado início ao processo administrativo para exclusão do sargento e encaminhou pedido “para que o Estado espanhol efetive a notificação do militar”.
“O Ministério da Defesa e a Força Aérea Brasileira (FAB) atuam firmemente para coibir irregularidades e repudiam condutas que não representam os valores, a dedicação e o trabalho do efetivo em prol do cumprimento de sua missão institucional”, concluiu a nota.
A Embaixada da Espanha no Brasil foi procurada para comentar o caso, mas não quis se manifestar sobre o processo que corre na Justiça espanhola.
Fonte – Uol