Não é que eu seja racista, mas existe uma história que só os negros sabem contar”. É a partir desse trecho do poema “Ponto Histórico”, de Luiz Carlos Amaral Gomes, declamado pela atriz Suely Bispo, que o documentário “A coisa Tá preta” introduz um debate sobre o racismo e seus impactos cotidianos, tomando como base a vivência de seis moradores de Linhares, além de outros capixabas que estudam e militam na causa.
O filme recém-lançado apresenta as raízes do racismo no Brasil, assim como a construção da cidadania do negro na sociedade, partindo de relatos – atuais e históricos – de dor, auto aceitação e resistência. “Essa nação nos deve muito pela forma com que fomos trazidos para cá e pelas oportunidades que nos foram tiradas durante séculos, justamente por trazermos […] na pele o peso desta cor”, afirma a professora de História, Maria Valdinéia de Oliveira Adão, em depoimento ao filme.
Idealizado e produzido pelo filósofo e cineasta Gabriel Filipe, natural do município de João Neiva e residente em Linhares, “A coisa tá preta” mostra como o racismo – velado e explícito – se manifesta nas mais diversas relações sociais e transforma situações cotidianas em desafios a serem superados por pessoas negras.
“Se você tem um juiz negro, ele tem que ser impecável. Ele não pode falhar […]. O mito do negro único faz com que nós repensemos até onde a gente pode e quer chegar. Ele faz com que duvidemos até da nossa capacidade de alcançar alguns locais. ‘Será que vou dar conta disso?’ Pois se estiver nessa posição, a cobrança vai ser muito maior por conta do meu tom de pele”, relata a professora e militante Ana Paula Ricardo.
Os depoimentos também abordam questões de representatividade e busca por um espaço na sociedade. “Como que o negro vai conseguir exercer sua cidadania, alcançar uma plenitude cidadã, se eu não consigo entender nem o meu lugar dentro dessa sociedade? […[ Se eu não consigo ver nem uma representação mínima dentro das instituições? Se o meu lugar está sempre numa periferia, numa margem da sociedade, fica difícil exercer a cidadania, pois o centro está distante da gente. E eu não vou conseguir nem transformar esse centro e muito menos participar”, questiona o jornalista Tiago Cau Marques.
Participação especial
Além do poema “Ponto Histórico”, que abre o documentário, a atriz Suely Bispo empresta seu talento à produção para declamar outros trechos de textos escritos por autores negros. Nascida em Salvador, a artista vive há muitos anos no Espírito Santo e é um dos principais nomes da militância pela valorização da cultura negra capixaba. Na dramaturgia, um de seus papeis mais conhecidos foi o da cozinheira “Doninha”, personagem da novela Velho Chico (Rede Globo/2016).
Disponível no Youtube e com acesso gratuito, “A coisa tá preta” foi produzido com recursos da Lei Aldir Blanc, criada de maneira emergencial para fomentar a cultura nos municípios em meio à pandemia. Todos os protocolos de segurança contra a Covid-19, como distanciamento e entrevistas on-line, foram adotados durante as gravações.
“Creio que o cinema é a melhor criação pedagógica já inventada pelo homem, tamanha a capacidade de despertar múltiplas emoções. E o objetivo do filme ‘A coisa tá preta’ é justamente provocar, até porque, enxergo o espectador como um sujeito que produz a realidade e tem a capacidade de modificá-la. Espero que o documentário continue para além da sessão, seja por meio de diálogos, conversas e, por que não, mudanças”, diz o cineasta Gabriel Filipe.
Ficha técnica:
Documentário: A coisa tá preta
Ano: 2021
Duração: 32:44 min
Direção e produção: Gabriel Filipe
Imagens: Álvaro Queiroz
Elenco: Ana Paula Ricardo, Évilyn Rosa Lirio, Joana Freitas, Marcos Vinicius Sá, Maria Valdinéia de Oliveira Adão, Poliane Passos, Ricardo Paixão, Tiago Cau Marques e Suely Bispo.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=_fNXmlqZOr8
*Assessoria de Comunicação